Month: Dezembro 2013

(Espanha) Estudios, Revista de Pensamento Libertário (Nºs. 1, 2 e 3)


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Nº 3: Ler AQUI

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Nº2: Ler AQUI

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Nº 1: Ler AQUI

A revista Estudios é publicada há dois anos e meios pela CNT. É a revista teórica da central sindical anarcosindicalista espanhola. Com uma periocidade anual está recheada de bons textos de actualidade. Em cada número há um dossier temático que dá capa à revista. É mais um exemplo do imenso ressurgir libertário que stá a acontecer um pouco em todos os continentes. Mais do que um ressurgir é um novo espaço de interrogação e de construção de alternativas que transborda pelas praças (neste caso, pelas revistas que juntam a teoria à prática) de todo o mundo. Viva, pois, a anarquia – a única forma de organização consequente, horizontal e igualitária.

(Chile) Erosión, Revista de Pensamento Anarquista (nºs. 1 e 2)


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Nº 1: aqui (PDF); aqui (issuu)

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Nº 2: aqui (PDF)

A revista Erosión é editada pelo Grupo de Estudos  José Domingo Gómez Rojas, de Santiago do Chile. É uma excelente publicação anarquista, de periocidade semestral e, quando sai um número novo, o anterior é disponibilizado na internet. É o que acaba de suceder com o nº 2 da revista, disponibilizada por ocasião da publicação do terceiro número, correspondente ao 2ºsemestre de 2013. Com 84 páginas (o 1º número) e 134 páginas (o 2º número), a Erosión tem artigos muito interessantes, de produção própria (a maior parte) ou retomados e actualizados a partir de outras publicações libertárias. Assume também a característica de ter muito poucas fotografias ou ilustrações. É um exemplo do grande fulgor da imprensa libertária internacional de que aqui, de vez em quando, vamos dando notícia.

(debate) Organização Não-Partidária: já vimos que é possível


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Muitas pessoas, cada vez mais, estão desiludidas com a representação partidária. A abstenção tem aumentado e é superior à percentagem de votantes. Será que precisamos de ser representadas? Porque não representarmo-nos a nós próprias?

Desde o recente empréstimo do FMI a Portugal, surgiram os chamados ‘movimentos sociais’, supostamente apartidários, mas não o sendo, pois o dedo de partidos está frequentemente por trás destes movimentos, e impede que os mesmos se radicalizem, ficando limitados ao jogo do que é bem aceite pelos media, e dependentes das agendas políticas/partidárias. Pelo mundo fora surgiram também recentemente os movimentos ‘Occupy’, e na Europa o movimento ‘Indignados’ (e as indignadas?), mas no final da década de noventa já tinha havido Seattle.

No entanto, estes movimentos, com as suas diferenças entre si, e para quem tal ainda não era claro antes, mostraram, talvez mais visivelmente na sua versão ‘de massas’, que é possível haver organização e acção independentes de partidos, apesar de a organização apartidária ser prática corrente de vários movimentos desde há muito. É possível organizarmo-nos fora de partidos, de forma horizontal, sem hierarquias, as tarefas devem ser rotativas para não ficarem viciadas e não permitir a criação de ‘especialistas’, o que no sistema representativo partidário conduz aos abusos e corrupção a que estamos habituadas.

Representarmo-nos a nós próprias/os permite participação directa na tomada de decisões, e pôr em prática a autogestão, que implica cooperação. É necessário colaborarmos umas com as outras, para chegarmos a fins comuns, e para isso temos que reconhecer a importância do apoio-mútuo, estar atentas a apoiar os/as companheiros/as de luta, para recebermos apoio também. Quando a via burocrática não resulta, o que acontece frequentemente, a luta ou protesto em causa requer a tomada de acção prática, chamada ‘acção-directa’.

Grupos de afinidade

A organização referida resulta em grupos pequenos, porque num grupo numeroso a participação de todos os elementos dificilmente é acompanhada por todas. Pode ser utilizada na preparação de protestos e no funcionamento de movimentos sociais, mas também na gestão e discussão de questões práticas do dia-a-dia, a nível de bairro, de rua, aldeia, vila, em qualquer contexto, de trabalho, lazer, ou outro. A organização em pequenos grupos facilita a comunicação, dentro dos mesmos, e com outros grupos. Há que rejeitar a organização ‘de massas’ – para lhes ‘darmos o arroz’. Não se trata de rejeitar protestos com participação numerosa, mas não os ter como objectivo principal, pois um trabalho regular daqueles grupos, articulados entre si, pode conduzir a resultados mais interessantes do que apenas manifestações de multidões. Mais importante que manifestações é a nossa organização no dia-a-dia, são necessárias redes de comunicação coesas, abertas ao público, ou fechadas, ou sob anonimato, que permitam troca de informação atempada, acerca do que aconteceu ou vai acontecer.

Claro, as diferenças partidárias, ideológicas, os sectarismos, as intrigas, as cúpulas, frequentemente não permitem essa articulação, quanto a isso cada um/a tem que encontrar as suas afinidades, o que pode não ser fácil com a grande apetência que existe para mexericos.

No período a seguir ao 25 de Abril as associações de moradores puseram em prática estes princípios de organização comunitária, depois entrou-se no individualismo em que estamos agora, o condomínio entregue a empresas privadas, e no geral muito pouca participação na decisão dos assuntos comuns do local onde se vive. No entanto, assembleias populares têm ressurgido, por exemplo no Porto, em Lisboa, Évora e Coimbra. Ainda funcionam as sociedades/associações culturais e recreativas de bairro ou localidade criadas no período do 25 de Abril, onde se podem realizar discussões acerca de problemas locais, mas são sobretudo locais de convívio e actividades culturais (ensino de música, teatro, línguas, desporto). Existem hoje muitas associações, com um papel social e interventivo, abordando diversos assuntos, sendo que algumas poderão ter uma organização horizontal na prática, apesar dos estatutos associativos exigirem organização vertical, e apesar de algumas estarem ligadas às autarquias locais, as quais são representantes de partidos e respectivos programas políticos.

Tais espaços, ou outros que existam, que se criem, ocupados ou alugados, podem ser recuperados e reutilizados, para debater questões urgentes que afectam a vida das habitantes. Locais assim já existem – serão poucos ou a participação é que é diminuta? O difícil pode ser fazer um maior número de pessoas participar na discussão de questões que as afectam directamente, retirá-las do individualismo apático tão característico dos dias de hoje – mas nos tempos que hoje vivemos, a cada dia que passa a participação é mais premente – participar significa não deixar que nos roubem o pouco que nos resta. Não podemos ficar à espera da Câmara Municipal e da Junta de Freguesia.

Não haver uma ideologia dominante

Com os princípios de organização referidos, ideias e ideologias diferentes continuarão a coexistir, e é desejável que continuem, pois não se pretende uma ideologia dominante. Tal frequentemente conduz a regimes totalitários, que parece ser para onde agora caminhamos em Portugal com as várias medidas económicas, políticas e (a)sociais levadas a cabo pelo actual governo, o qual tem mandado executar acções repressivas a vários níveis, como resposta aos protestos que se multiplicam, com o intuito de incutir medo em quem se manifesta contra as suas medidas opressivas, verificando-se uma escalada da violência policial nas ruas, esquadras e prisões.

Anticapitalismo, antifascismo, e antiautoritarismo, são princípios basilares da forma de organização que aqui se aborda.

Neste tipo de organização, continuam a existir algumas com maior aptidão para se exprimir e apetência para liderança, outras menos interventivas, isso é sempre assim, mas é essencial todas terem palavra, e sermos capazes de ir além das aparências, pois há sempre quem tente manipular, à procura de benefício próprio. Líderes não são imprescindíveis, podemos organizar-nos sem ter alguém a comandar. É essencial manter independência em relação a partidos políticos, os quais obviamente não vão desaparecer tão cedo, nem todas as pessoas que deles fazem parte deixarão de fazer, com as quais podemos concordar ou não, e colaborar ou não.

Este tipo de organização pode também ajudar a diminuir atitudes e comportamentos autoritários, frequentes mesmo entre as que se consideram antiautoritárias – há sempre quem goste de mandar – o autoritarismo provoca repulsa, até de ideias que poderiam ser bastante frutuosas quando apresentadas de outra forma – ninguém é dona da solução suprema.

É uma forma de organização que, poderá argumentar-se, seja mais frágil, mais facilmente manipulável e infiltrada por quem a quiser desacreditar, por um lado, por outro lado numa organização que funcione em grupos pequenos, é mais fácil abordar e travar tais tentativas de manipulação. Valoriza-se a espontaneidade em detrimento de burocracia. A organização apartidária não é uma fórmula perfeita e instantânea que resolve tudo, é uma via de organização popular de base que pode permitir uma participação, discussão, e responsabilização, directas, numa altura em que a corrupção e a injustiça social atingem níveis intoleráveis e em rápido processo de piorar ainda mais. Esta pode ser uma forma de asfixiar o capitalismo, pelo menos no modo como nos relacionamos entre nós, que nos quisermos organizar assim, e contribuir para atenuar a importância dominante do poder representativo, as divisões dentro das nações, e até as fronteiras entre nações, através do contacto entre grupos de afinidade de diferentes países.

A mais antiga e natural organização

Esta será talvez a mais natural e mais antiga forma de organização popular, que requer ser mais praticada para dar frutos. Na verdade já o é, de certo modo, em associações, colectividades, e grupos de interesses mais ou menos informais. Todos os dias muitas a praticam, por vezes até sem repararmos – a partilha e a solidariedade são intrínsecas ao ser humana, embora o capitalismo nos impinja a toda a hora que temos que competir, passar por cima de quem está ao nosso lado, ver a outra como inimiga. Na realidade, por vezes somos obrigadas a sê-la em parte, mas muitas outras vezes podemos rejeitá-la, questionar, recordar que para quem tenha como prioridade a criação de uma sociedade justa, equilíbrio e harmonia são os objectivos, não o são o prestígio, a casta social, a fama, o materialismo, a fortuna, o consumismo. Profundos conhecimentos de teorias ou filosofias políticas e económicas também não são imprescindíveis, efectivamente sabemos quais são as necessidades básicas universais, não só ainda não atingidas, como a serem-nos grandemente roubadas – alimentação, habitação, saúde, educação, cultura.

Será esta uma visão simplista? Grande parte da complicação advém da sede de poder de muitas que entram na política para enriquecer, da ganância, desde sempre associadas à política, esta sempre ligada ao poder, e ao desejo de mandar. Imagine-se o que se poupava em altos dignitários, deputados, assessores, e parasitas afins, com todas as suas mordomias, num sistema representativo onde muitas vezes existem salários acima da média, corrupção, reformas antecipadas, estilos de vida de luxo e despesismo descarado. Política deve ser contribuir para o bem comum, não o privilégio de poder acumular benefícios pessoais.

Neste momento, os líderes do principal partido da falsa dicotomia, que agora não está no poder, apelam a que voltemos, mais uma vez, para além da náusea, a acreditar nas suas mentiras, e aguardam voltar ao poder.

Quanto ao voto, que mandata os partidos no poder, desde sempre as imigrantes deveriam ter direito a ele, inclusive as oriundas de países exteriores à União Europeia, mas mais importante que o voto é a organização das imigrantes, a sua luta pelos seus próprios direitos, a sua capacidade reivindicativa, e a solidariedade da restante população para com elas. Senão, as imigrantes estarão sempre dependentes dos programas dos partidos lhes darem mais ou menos atenção, isto sobretudo numa altura em que a extrema-direita tem vindo a crescer na Europa.

Imigrantes ou não, o essencial dos direitos exige-se e conquista-se além do voto, na organização das lutas no dia-a-dia.

Os protestos contra membros do governo, por estudantes e não só, que culminaram na saída do ministro marrão, já podiam e deviam ter acontecido desde há muito, sem ser necessário um partido por trás para tal acontecer. Os protestos têm que se emancipar dos partidos, senão deixamos que sempre decidam por nós.

Mesmo com a saída de ministros, os governos mantêm-se no poder “legalmente”, até ao fim do mandato, e legalmente fazem alterações às leis, algumas irreversíveis, que destroem a vida de milhões de pessoas. Veja-se a actual situação da Hungria.

O futuro, desde já no presente, é a organização não-partidária, exigente e autónoma.

Orga Niza  (via email)

Não é colaborador. É trabalhador!


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Nos últimos tempos as empresas passaram a adoptar a palavra colaborador em substituição da palavra trabalhador. Segundo o dicionário a palavra colaborador resume-se a :

Pessoa que trabalha com outra em iguais circunstâncias de iniciativa. (“colaborador”, in Dicionário Priberam da Língua Portuguesa)

Sabendo de antemão que a relação entre o trabalhador e patrão se resume a uma relação de violência, a palavra colaborador torna-se ridícula. Segundo Bakunin, se eu ofereço o meu trabalho pelo melhor preço e permito que o patrão viva do meu trabalho não é certamente pela minha devoção ou porque gosto dele. Quando o faço é porque morreria a fome se não trabalhasse para algum patrão, portanto eu sou obrigado a vender o meu trabalho ao menor preço possível e sou obrigado a faze-lo sob a ameaça de fome.

A partir do momento em que eu sou obrigado a trabalhar sob uma ameaça a palavra colaborador deixa de fazer sentido, visto eu não trabalhar em igual circunstância com o meu empregador, eu trabalho para me e para o alimentar.

Logo eu não sou colaborador, sou trabalhador.

FL (via mail)

Amanhã num supermercado perto de si


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Sábado, 21 de Dezembro de 2013, 17:00

Pingo Doce da Rua 1 de Dezembro perto da Praça do Rossio

(ou onde houver Pingos Doces e desempregados)!

A 4 de Dezembro, Nelson Arraiolos, desempregado de longa duração sem rendimentos, dirigiu-se ao supermercado Pingo Doce para levar um pacote de arroz sem pagar, numa acção simbólica contra a austeridade que atira cada vez mais desempregados para uma criminalidade envergonhada, forçados a roubar só para garantir que os filhos não dormem de barriga vazia.

O Pingo Doce disse compreender a acção e ofereceu-lhe um cabaz de Natal, manifestando-se solidário com a sua causa.

No dia 21 de Dezembro, vamos todos nós, desempregados, aos supermercados Pingo Doce exigir também o nosso cabaz de Natal grátis!

Oferecem a um, oferecem a todos!

  • Porque a Jerónimo Martins do Pingo Doce e 19 das 20 maiores empresas portuguesas fogem aos impostos via Holanda, empobrecendo todos os portugueses que têm de pagar por elas.
  • Porque lucrou 360 milhões em 2012 a explorar e pagar mal aos seus trabalhadores e a esmagar os pequenos e médios produtores, obrigando-os a vender abaixo do custo de produção para depois revender os produtos por vezes 100% mais caros.
  • Porque até quando finge a caridade, o Pingo Doce e os outros distribuidores, continuam a lucrar nas campanhas de recolha de alimentos com as compras dos clientes.
  • Porque a fortuna do segundo homem mais rico do país e dono do Pingo Doce, Soares dos Santos, matava a fome a 1.500.000 desempregados.
  • Porque no meio de uma miséria inimaginável em 2013, o número de multimilionários aumentou de 785 para 870 às custas do empobrecimento de 2,6 milhões de pessoas.

Neste sistema, se não damos lucro, não temos direito a viver. O que fomos no passado não interessa. Hoje somos todos desempregados. Há que lutar, unidos, porque somos 1.500.000 desempregados e juntos venceremos com facilidade 870 multimilionários e os políticos que os servem.

Também em Setúbal: https://www.facebook.com/photo.php?fbid=243001225862967&set=a.110359722460452.20510.100004592732318&type=1&theater

mais: https://www.facebook.com/maria.cabaz

http://cabazesparadesempregados.wordpress.com/

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“Alentejo em Luta”, de Elias Matias agora na internet


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Editado em 1985 pela editora libertária “A Sementeira” esta pequena brochura dá à estampa um texto de  memórias de Elias Matias (1888-1990),  anarquista eborense e um dos militantes que esteve envolvido na criação das primeiras associações de rurais alentejanos, nos primeiros congressos rurais e nas greves que os trabalhadores agrícolas alentejanos desenvolveram durante os primeiros anos da República. Por ser um testemunho importante e por este pequeno livro estar praticamente esgotado decidimos disponibilizá-lo em formato PDF para todos os que o queiram consultar. (ler aqui: Alentejo em Luta – (Testemunho sobre os trabalhadores rurais na 1ª República))

Bolívia: entrevista a Mujeres Creando (colectivo anarquista/feminista)


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Julieta Ojeda integra “Mujeres Creando”, uma organização feminista/anarquista na Bolívia que tem sido uma voz radical dos direitos das mulheres antes e durante o mandato de Evo Morales na Presidência do país. Entrevistámo-la na “Virgem dos Desejos”, o espaço cultural de “Mujeres Creando”, em La Paz, em Maio de 2012, num momento de diversas mobilizações sociais contra o Movimento para o Socialismo (MAS, o partido do governo). Entre as mais destacadas dessas mobilizações esteve uma greve de médicos e profissionais da saúde em protesto pelo aumento da duração do horário de trabalho. Outra teve a ver com o projecto de uma estrada que passava através do Território Indígena e Parque Nacional Isiboro Sécure (TIPNIS), uma reserva natural protegida e lugar de comunidades indígenas nas terras baixas do país. (O projecto da estrada e a sua construção foram temporariamente suspensas em Abril de 2013).

Benjamin Dangl & April Howard

– BD & AH – Que significam os conflitos actuais no vosso país, em particular no que se refere ao TIPNIS, como expressão da política do governo do MAS relativamente aos povos indígenas?

Julieta Ojeda: Em princípio Evo [Morales] é um símbolo, enquanto indígena que chegou ao poder e assumiu o poderoso papel de presidente. Pelo facto de ser um indígena assume-se que defenderá os indígenas. Mas a relação que assumiu com as trinta e quatro nacionalidades indígenas diferentes que habitam a Bolívia revelam que ele não é um homem que se identifique com esta imagem. Dizem que é indígena, não? E, sim, é-o, mas identifica-se principalmente com os cocaleros [agricultores de coca]. Nesse sentido não é indígena, mas sim cocalero, e ele responmde a esse sector. E há outra questão. Sob o governo do MAS há indígenas de primeira e autóctones de segunda classe. Outra questão é o aymara-centrismo, já que os povos indígenas que têm algum valor para este governo são os que estão no oeste, não os outros, os das terras baixas.

Tornou-se evidente para nós que Evo não vai ser um homem que respeite a natureza, ou seja, que respeite a “Pachamama” [Mãe Terra], como tinha prometido no seu discurso. O seu governo tem um projecto desenvolvimentista, um mau projecto desenvolvimentista, pode-se dizer, uma vez que os povos indígenas das terras baixas têm as suas próprias formas de exploração racional e de gestão sustentável dos seus recursos. Têm uma visão de desenvolvimento, mas um desenvolvimento que não destrói a natureza. E o governo de Evo Morales tem outra visão completamente distinta.

– BD & AH –  O que está a fazer o MAS para cooptar os movimentos sociais de forma a manter e a estender o seu próprio poder político?

Julieta Ojeda: O MAS entrou em certas organizações e dividiu-as. Entram nestes espaços do movimento social e criam divisões constituindo as suas próprias organizações paralelas. Esta tem sido uma prática comum que o poder sempre utiliza contra os movimentos sociais ou os grupo que se lhe opõem, não foi inventada pelo MAS. A diferença que existe agora é que quem está no governo também ocupa outros espaços no cenário político. Já não são um movimento social, mas continuam a funcionar como um sindicato ou um movimento para poderem continuar a infiltrar-se nas organizações para as dividirem.

Por exemplo, as divisões criadas no movimento indígena das terras baixas foram provocados pelo MAS. Fizeram-no depois da oitava marcha contra a estrada através do TIPNIS. Até então a unidade tinha existido, obviamente com desacordos e tudo o mais, mas tinha-se optado por deixar de lado as diferenças para mostrar unidade. Mas depois da oitava marcha, o MAS começou a cooptar os líderes e as comunidades no seio das organizações das terras baixas.

É também assim que fazem com outros conflitos sociais, como o recente com o sector médico, quando assinaram um acordo co os administradores da saúde, mas não com os próprios médicos. Por isso, se converteu numa luta longa, já com pelo menos dois meses de conflito. Assinam um acordo com um  grupo, e não com outro, como aconteceu com os mineiros; e é isso que fazem também nos conflitos regionais, criando facções opostas às que impulsionam as mobilizações. De forma que está é uma prática permanente do MAS para gerar grupos paralelos e opô-los aos activistas.

– BD & AH –  No actual quadro político, como vê o papel de “Mujeres Creando” e o impacto do vosso trabalho?

Julieta Ojeda: Conseguimos consolidar espaços como esta própria casa e também um certo grau de legitimidade social e de relevância política. Quer isto dizer que “Mujeres Creando” tem um lugar e um espaço dentro da sociedade, o que deve ser entendido de modo relativo, já que isso acontece para algumas coisas e para outras não. Para além disso, temos tido sempre um espaço na rádio e também temos sido presistentes no nosso projecto político.

Temos também tomado uma posição pública face às políticas de Evo Morales, como no caso do TIPNIS e da oitava marcha, à qual nos unimos e apoiámos com todos os nossos recursos. Deste modo, temos sido muito críticos de alguns dirigentes e na defesa deste território contra o projecto de estrada que o atravessaria, porque isso é brincar com o futuro.

Criticámos também o machismo do presidente em várias ocasiões, assim como o machismo do governo nas suas diferentes manifestações. Por exemplo, as tentativas de organizar o concurso de Miss Universo na Bolívia. E fazemos tudo isto não através de escritos, mas sim de acções públicas.

Estamos a tentar provocar um debate mais aberto e mais amplo sobre o tema do aborto. A Igreja opõe-se e sacou de todas as suas armas para conseguir cancelar esta discussão. Neste caso o governo de Evo Morales foi muito tíbio. Este é um governo muito conservador quanto aos direitos dos homossexuais e ao aborto ou a qualquer coisa que tenha a ver com as mulheres ou com o direito das mulheres. Falam do que fizeram, como o subsídio para as mães, mas tem que ser-se mãe para o conseguir, o que mais uma vez reforça a ideia de que as mulheres só têm valor quando são mães.

Na realidade, este governo não nos vê como um inimigo, mas sim como uma pequena pedra no sapato, uma irritação constante. Mas tão pouco decidiram fazer alguma coisa contra nós, porque quando o governo decide que alguém é um inimigo é terrivelmente vingativo, como o têm sido com os dissidentes que tratam de enterrar politicamente. Mas situamo-nos no papel que descrevi, embora não nos limitemos a ser exclusivamente um adversário das políticas oficiais já que temos o nosso próprio projecto político, e isso é apenas uma parte do que fazemos.

[Esta entrevista foi originalmente publicada em inglês em http://upsidedownworld.org/main/bolivia-archives-31/4600-the-government-and-the-street-in-bolivia-an-interview-with-julieta-ojeda-of-mujeres-creando, e integra um livro que deverá ser publicado proximamente intitulado “Until the Rulers Obey: Voices from Latin American Social Movements”. A tradução actual em português foi feita a partir da versão em castelhano publicada por El Libertario.]

http://www.mujerescreando.org

https://www.facebook.com/VirgenDeLosDeseosLaCasaDeMujeresCreando

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(Lisboa) Mesa-redonda sobre o Problema da Habitação em Portugal


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Amanhã, 17 de Dezembro, 18,30H, no Espaço Grandella (Estrada de Benfica, 419, Lisboa)

Mesa Redonda: O Problema da Habitação em Portugal Hoje: Que soluções?

Tertúlia Liberdade
Colectiva Habita
Associação dos Inquilinos Lisbonenses
Vitor Lima (Moderador)