Nº 2 . Março de 2014.
Crítica social e da tecnologia e poesia ameríndia. Capa e contracapa de Tiago Mourato. Editor e coordenador: Júlio Henriques. 122 Págs. broch. € 5,00.
Júlio Henriques ► Novos descobrimentos portugueses – Óscar Faria ► Bolor – Miguel Teotónio Pereira ► Crónica da crise – Jorge Valadas ► Anti-amnésia (sobre a historia dos Cadernos de Circunstância) – Jorge Valadas ► A versão dos vencedores – Jacques Ellul ► Autonomização da Técnica Christian Ferrer ► In memoriam: os ludditas – Os Amigos de Ludd ► George Orwell, crítico da Máquina – Para uma antologia da poesia ameríndia contemporânea – Quim Sirera ► O Encontro de Vícam – Georges Lapierre e Quim Sirera ► Indigenismo e comunalidade – Paulo Barreiros ► O espírito da terra – Joëlle Ghazarian ► Peter Watkins, nómada do cinema – Vítor Silva Tavares / Óscar Faria ► Lembrando Manuel João Gomes – Júlio Henriques ► Triunfo da neoparolice
À venda entre outros locais nas livrarias Utopia e Gato Vadio – Porto; Letra Livre, BOESG em Lisboa, etc.
FLAUTA DE LUZ (nº 1, Janeiro 2013)
JÚLIO HENRIQUES Prólogo; JERRY MANDER Na ausência do sagrado; CHARLES REEVE O pesadelo acordado do povo português; SIMON ORTIZ Dois poemas; FRANÇOIS CHEVALLIERAutodesprezo; WILLIAM H. KÖTKE Um novo mundo; GÜNTHER ANDERS Canibalismo pós-civilizacional; JEAN CLAIR Eufemismos SURVIVAL INTERNATIONAL; TERI C. MCLUHAN Os Koguis; DAVID WATSON Seis teses sobre a energia nuclear; DIETMAR SEDLMAYR Origens da ideologia do Progresso; N. SCOTT MOMADAY Canção de júbilio de Tsoai-Tali; JEAN LIEDLOFF O Principio da Continuidade; JÚLIO HENRIQUES Viver sem televisão; N. SCOTT MOMADAY Cemitério da Montanha Chuvos; JÚLIO HENRIQUES A civilização avança
relacionado: http://revistaalambique.wordpress.com/2013/03/09/flauta-de-luz/
http://viasfacto.blogspot.pt/2013/03/uma-revista-nova-para-velha-crise.html
Com o passar dos anos e o estreitar da amizade, a admiração que nutro pelo Júlio Henriques cresceu exponencialmente. Ele é a pessoa mais inteligente, idealista e culta que já conheci. O seu desapego (materialista) e a sua generosidade e cordialidade são também muito difíceis de igualar. Mais do que um grande escritor, é um bom homem com uma mente brilhante ao serviço das melhores causas.
Há quem diga que ele tem um olhar triste e tímido. Mas é de riso fácil, desfrutando de um sentido de humor muito aguçado, podendo esgrimir, como poucos, a sátira de pendor surrealista, como uma poderosa arma política capaz de virar do avesso qualquer rei nu na tragicomédia da vida cheia de absurdas ironias e gritantes injustiças que enfrenta com destemor incansável. Até costuma se atrever em arriscadas incursões pelo campo minado dos trocadilhos, e sai de lá inteiro.
Guerreiro e mestre das palavras, sabe ser demolidor contra tudo o que é pomposo, dogmático, opressivo, obscurantista e deletério ao essencial e verdadeiro, ofendendo os seus admiráveis ideais & desideratos. Não obstante, nunca deixa extinguir a sua natural candura e pulsão daimosa junto de todos os que têm o privilégio da sua companhia.
Tranquilo, gentil e ponderado; nunca o vi ripostar com injuriosa agressividade, dando troco na mesma moeda. Avesso a desgastantes celeumas, não levanta a voz e nem sequer expressa desagrado através de grosseiras interjeições. Por definição, [ter] fé é acreditar sem ter suficientes evidências. Como seria de esperar, o J.H. não chafurda alegremente na credulidade ingénua. O seu ceticismo crítico é indissociável duma ética humanista e humanitária. Eu sou demasiado míope para conseguir lobrigar a rútila esperança que ele acalenta para a humanidade. Daí consegue destilar otimismo suficiente para continuar a perseguir o sonho de comunidades alternativas unidas por projetos que visem a sustentabilidade solidária e de inspiração anarcotribalista. Suspeito que ele gostaria de escolher a dedo os membros da comunidade que ainda aspira assentar arraiais…Boa sorte. A par da idade avançada, o acumular de más experiências na convivência prolongada com a malta dita “alternativa” , vão minando a sua vontade em aventuras cheias de “desvarios e idealizações “ (como ele próprio define), que exijam chutar para a valeta o conforto e o sossego que já granjeou.
Mas é um diligente construtor de utopias. Pedra por pedra, em artes de aprimorado alvanel que arrosta a maldição de Sísifo.
Se tem um cata-sonhos na sua consciência, por empatia, nele ficou acumulada uma quantidade ingente de horrores mundanos, como se se tratasse duma rede de contenção de detritos flutuantes num rio poluído – que o J.H. insiste em limpar até onde as suas mãos alcançam. Espantosamente, tamanho fardo não chega a lhe obnubilar o olhar & espírito. Esse seu encantamento e estoicismo não conformista é muito inspirador.
Tem a sensibilidade de poeta libertário em reconciliação telúrica. Deve ser por isso que se dá tão bem com as crianças, os desajustados e os animais. Para todos estes consegue criar ambientes solazes.
Nunca me forçou a porra alguma, assim como eu também não tive a menor necessidade de o impressionar. reiteradamente se mostrou pronto para me ajudar. E deu-me tempo para crescer, até eu conseguir flanar com familiaridade pelos vastos e complexos bosques do seu ideário . E nem foi necessário indicar-me o caminho das pedras. Talvez por ingenuidade, cheguei a acreditar que esse homem extraordinário nutria alguma admiração por mim. O suficiente para consolidarmos o respeito mútuo, como base para uma amizade digna desse nome. Houve um tempo em que ele até me pedia conselhos, na qualidade de naturalista também enamorado pela ciência. O mais triste foi ter recentemente perdido o J.H., não tanto para a Covid-19, mas para a pandemia de perigosas e aviltantes conspirações anticientíficas que se opuseram às vacinas… As convicções ludditas que nos unem acabaram por nos empurrar para direções opostas no que diz respeito à ciência.