biografia

(in memoriam) Helena Leonor Martinho dos Santos (1950-2017)


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Rebelde, internacionalista, libertária,

grande amiga e protectora dos animais,

minha amada, minha companheira

     “O céu é o nosso tecto, a terra é a nossa pátria, a liberdade é a nossa religião.” Quantas vezes lhe ouvi este magistral provérbio do Povo Rom! Nascida e criada no bairro popular lisboeta de Marvila, rebelde, internacionalista e libertária por espírito, por convicção e por forma de viver, a Lena sempre se orgulhou da sua origem Rom (cigana) pelo lado paterno e operária pelo lado materno.

     Quando nos conhecemos, em 1980, trazia pela trela a Kvit, a sua fiel amiga loba cruzada com pastor alemão, e dentro da mochila um títere com que fazia teatro de marionettes pelas ruas de Lisboa… Emprestou-me um livro de Marcuse com a inscrição “Helena Paris 73” na primeira página: era o “Contre-Révolution et Révolte”, que tratava da Nova Esquerda radical e de uma nova atitude revolucionária face ao homem, à natureza e à arte… E ofereceu-me um exemplar da revista Raiz & Utopia, onde vinham publicados uma jóia do poeta guerrilheiro cigano antinazi Spatzo e um magistral depoimento programático da sua própria autoria. São estes dois textos que reproduzo a seguir (os títulos são meus).

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Manuel Fiúza Júnior, um anarquista de Viana do Castelo, assassinado pela PIDE em 1957


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Placa toponímica da Rua Manuel Fiuza Junior, em Viana do Castelo, onde – como é regra quando se trata de anarquistas – é omitida a sua militância libertária.

Manuel Fiúza Júnior nasceu em 1887, na cidade de Viana do Castelo, onde editou, por alguns anos, o quinzenário anarquista A Voz dos Famintos. Apesar de modesto na colaboração e no aspecto, este jornal, que juntava o seu grito ao clamor dos que, em todo o mundo, reclamam mais um pouco de pão, de justiça e liberdade, exerceu uma profunda influência doutrinária entre a juventude da região minhota, alfobre, desde recuados tempos, de grandes rebeldes e revolucionários, que ilustraram com o seu nome e a sua acção fecunda as páginas da história do movimento operário, principalmente do anarco-sindicalismo.

Veio, no entanto, a quartelada do 28 de Maio de 1926 e com ela o fascismo que navegou nas suas águas, obrigando Manuel Fiúza Júnior aos subterrâneos da luta clandestina, para prosseguir a batalha que redime os homens de todas as vilezas e de todas as debilidades. Nesta cruzada foi encontrar a morte violenta, melhor dizendo, foi assassinado na sede da PIDE na Rua do Heroísmo, 329, no Porto, para onde fora conduzido sob prisão, contando então 70 anos de idade.

Viviam-se os anos de 1957, quando é preso e, 15 dias depois, morto, na sede da P.I.D.E, do Porto, Joaquim Lemos de Oliveira, natural de Fafe. Denunciando este crime, foram distribuídos milhares de manifestos e pela responsabilidade do seu aparecimento em Viana do Castelo é preso Manuel Fiúza Júnior. Conduzido pelos carrascos inspector Costa Pereira e chefes Pinto Soares e Patacho, colocado na tortura da “Estátua”, não resistiu ao suplício e morreu.

Foi mais um anarquista que deu a vida em holocausto ao ideal libertário.

Fonte: E. Rodrigues (1982). A oposição Libertária em Portugal. 1939-1974. Lisboa. Sementeira.

aqui: http://mosca-servidor.xdi.uevora.pt/projecto/index.php?option=com_jumi&fileid=13&p=creators&char=J&id=1458

também aqui: https://colectivolibertarioevora.wordpress.com/2016/02/17/memoria-libertaria-manuel-fiuza-junior/

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(efeméride) Adelaide Cabete, a ‘Louise Michel’, nasceu há 150 anos


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Assinalam-se hoje os 150 anos do nascimento de Adelaide Cabete, alentejana, natural  de Elvas. Formada em medicina, foi colaboradora e dirigiu várias publicações dirigidas às mulheres. Republicana e filiada na maçonaria – que hoje celebra o seu nascimento – , onde adoptou o nome da anarquista francesa Louise Michel, o que prova que “era alguém muito próxima dos ideais anarquistas”, como sustenta a investigadora Isabel Lousada nesta entrevista. Adelaide Cabete foi também uma assídua colaboradora do jornal anarco-sindicalista “A Batalha”, orgão da CGT. 

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De seu nome completo Adelaide de Jesus Damas Brazão Cabete, nasceu em Elvas, freguesia de Alcáçova, a 25 de Janeiro de 1867, filha de Ezequiel Duarte Brazão e de Balbina dos Remédios Damas. Oriunda de uma família humilde, começou a trabalhar muito nova e casou com o sargento republicano Manuel Fernandes Cabete, que a incentivou a estudar.

Em 1889 prestou o exame de instrução primária e, em 1894, concluiu o curso liceal. No ano seguinte mudou-se para Lisboa, onde se matriculou no ano seguinte na Escola Médico-cirúrgica, instituição onde concluiu o curso em 1900 com a tese Protecção às Mulheres grávidas Pobres como meio de promover o Desenvolvimento físico das novas gerações (1900).

Republicana militante, participou activamente na propaganda que antecedeu a mudança de regime em 1910. Professora no Instituto Feminino de Odivelas e médica, procurou sempre defender a melhoria das condições de vida das crianças e das mulheres, com particular ênfase na luta contra a prostituição e o alcoolismo. Propagandista do feminismo fundou e presidiu ao Conselho Nacional das Mulheres Portuguesas e da Cruzada Nacional das Mulheres Portuguesas, à Liga Portuguesa Abolicionista, às Ligas de Bondade e dirigiu a revista Alma Feminina (1920 – 1929).

Na Universidade Popular Portuguesa organizou um curso de Higiene e Puericultura. Participou no Congresso Internacional de Ocupações Domésticas (Gand, 1913), no Congresso internacional Feminino de Roma (1923), no Congresso do Conselho Internacional das Mulheres (Washington, 1925), nos I e II Congressos Feminista e da Educação (1921 e 1928), nos Congressos Abolicionistas (1926 e 1929). Viveu em Angola entre 1929 e 1934, onde continuou a sua acção a favor da higiene e da assistência. Colaborou em numerosas publicações periódicas como: Educação, Educação Social. O Globo, A Mulher e a Criança, Pensamento, O Rebate.

Iniciada em 1 de Março de 1907, na Loja Humanidade, com o nome simbólico de «Louise Michel». Atingiu os graus 2 e 3º em 1 de Março de 1907, 4º em 28 de Julho de 1910, 5º, 6º e 7º em 16 de Janeiro de 1911. Grau 30º do REAA em 28 de Outubro de 1923. Conservou-se na Loja no período em que laborou sob os auspícios do Grande Oriente Lusitano Unido (até 1913 e depois de 1920 até 1923) e posteriormente, após a adesão da Loja Humanidade à Ordem Maçónica Mista Internacional O Direito Humano, em 1923. Foi eleita várias vezes Venerável da sua Loja e Grã-Mestra do Areópago Teixeira Simões (1926).

Morreu em Lisboa, na freguesia de São Sebastião da Pedreira, a 19 de Setembro de 1935.

(memória libertária) José Negrão Buísel (1875-1954), um anarquista de Portimão


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José Negrão Buísel é uma das referências do anarquismo no Algarve. Professor, seguidor das ideias pedagógicas libertárias da escola Moderna de Francisco Ferrer, esteve ligado à Federação Anarquista do Sul e posteriormente à CGT. Preso por diversas vezes, o seu nome foi atribuído, após o 25 de Abril de 1974, a um estabelecimento de ensino e a uma rua de Portimão.

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“O ódio que Mário Botas tinha contra a burguesia era de uma imensidão inaudita”


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O pintor Mário Botas nasceu a 23 de Dezembro de 1952 na Nazaré. Em Lisboa, a seguir ao 25 de Abril de 1974, foi uma presença constante nos meios libertários, nomeadamente como frequentador da sede de “A Batalha”, na rua Angelina Vidal.  A poucos dias de mais um aniversário do nascimento de Mário Botas recuperamos este artigo de José Maria Carvalho Ferreira, que com ele manteve estreitas relações de amizade até à sua morte, a 29 de Setembro de 1983, em Lisboa, publicado na revista “A Ideia”, de Novembro de 2013.

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Biografia do anarquista algarvio Bartolomeu Constantino (1863-1916)


Biografia do anarquista algarvio Bartolomeu Constantino (1863-1916)

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Operário sapateiro, nasceu em Olhão em 1863 e faleceu em Lisboa, no Beco da Ricarda, n.° 4, em 11 de Janeiro de 1916. Figura controversa, Bartolomeu Constantino foi um extraordinário orador do anarquismo. Sempre que solicitado para falar em algum lugar, fechava a sua pequena banca de trabalho e seguia corajosamente sem a preocupação do que podia acontecer. Foi o promotor do Congresso Anarquista de 1911, abrindo espaço às ideias libertárias e possibilitou logo em 1914 outro encontro acrata. Durante o governo de Afonso Costa viveu no Algarve onde lançou um jornal, com a ajuda da sua companheira Júlia Cruz. Também viveu algum tempo em Almada, mas para o seu espírito irrequieto, os lugares tornavam-se pequenos.

Falando do transladamento dos seus restos mortais A Batalha de 5-10-1922, informa em 1ª página: “A Comissão pró-transladamento convida a C.G.T., U.S .0 ., Federações, Sindicatos, Juventudes Sindicalistas e Comunistas Libertários e grupos revolucionários”. E concluía: “O itinerário é Loreto, Praça Luís de Camões, rua do Mundo, S. Pedro de Alcântara, Praça Rio de Janeiro, Escola Politécnica, Praça Brasil, rua Visconde de S. Ambrósio, rua Saraiva de Carvalho e Cemitério dos Prazeres”.O proletariado e os anarquistas de Lisboa compareceram em massa a confirmar o apreço ao orador anarquista.

Embora o seu nome tenha caído um pouco no esquecimento, de que urge resgatar, tem hoje uma praceta com o seu nome no Laranjeiro (Almada) (https://goo.gl/maps/e9wD6zf8Rfx)

BARTOLOMEU CONSTANTINO

Bartolomeu Constantino foi um dos anarquistas portugueses mais proeminentes, senão o mais proeminente, no período conturbado da transição entre a Monarquia e a República. Ao contrário de quase todos os outros revolucionários do seu tempo, que após a queda da monarquia, se foram rendendo às mordomias e corrupção do novo regime republicano, Bartolomeu Constantino manteve sempre uma grande autenticidade de convicções, tendo morrido em 11 de Janeiro de 1916 na mais completa miséria, com 52 anos. Ao longo da vida esteve preso 36 vezes! Tal como vem descrito no Assento de Baptismo nº 145 do Livro dos Assentos dos Baptismos da Igreja da Nossa Sra. do Rosário da Vila de Olhão (existente no Arquivo de Faro) e confirmado pelos Arquivos do Cemitério dos Prazeres em Lisboa (onde ocorreu o seu funeral), Bartolomeu Constantino nasceu em Olhão, na Rua das Lavadeiras, em 23 de Junho de 1863, filho de mãe solteira, Antónia da Cruz, e de pai incógnito, neto materno de António da Cruz e Rosa da Conceição.

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A mãe poderia ser lavadeira, o que é confirmado não só pelo nome da rua em que residia, onde na época trabalhavam as lavadeiras em tanques apropriados, como pela vaga memória que os seus descendentes ainda têm (segundo estas informações, incertas e talvez romanceadas fornecidas pela família, o pai de Bartolomeu Constantino seria um militar francês…).

Não sabemos quanto tempo terá vivido em Olhão (nas consultas efectuadas ao censo de 1863 e 1868, em Olhão, não o encontrámos…) mas teve seguramente uma origem muito humilde pois era sapateiro, provavelmente por influência do seu padrinho, José Francisco Xavier, que tinha esta profissão. Curiosamente os sapateiros constituíam nesta época a classe operária mais instruída do Algarve (Marques, Maria da Graça Maia – O Algarve da antiguidade aos nossos dias: elementos para a sua história – Ed. Colibri, Lisboa, 1999, ISBN 972-772-064-I, p.467) e Bartolomeu Constantino não fugiu à regra: de forma autodidacta educou-se, e dentro da sua actividade política foi sindicalista, actor de teatro e jornalista.

Dotado de qualidades oratórias extraordinárias, tornou-se num exaltado apologista da divisão equitativa da propriedade e das riquezas, passando a sua palavra a ser indispensável nos grandes comícios revolucionários da época.

Abílio Gouveia, num artigo publicado na Voz de Olhão de 3-6-1976 transcreve o comentário que o escritor Rocha Martins faz da actuação de Bartolomeu Constantino na grande parada operária do 1º de Maio de 1893:

Pela primeira vez em Portugal se fizeram em comícios proletários as afirmações duma alta grandeza moral. Celebrara-se a reunião no teatro da Alegria e um anarquista eloquente, o sapateiro Bartolomeu Constantino, fizera vibrar as massas obreiras com os seus arrancos condenatórios da sociedade. Era calvo, de grande barba; os olhos vivos, debruados de vermelho duma inflamação teimosa; a sua voz tocava todas as gamas e, ao erguê-la, furiosa e indignada, o artífice lembrava um apóstolo, como os precursores de cristianismo, pregando, de entre os farrapos, aspirações de fraternidade. Falava para as estrelas, com os pés no pântano; o seu trajo roto esquecia, ante o ardor das suas exortações.

Quando as acabava, entre palmas, ia para o canto humilde da sua casa puxar o fio enserolado com a mão calosa, apertada pelos políticos. Arrebatava o povo e sofria, o honrado trabalhador, o boca de oiro do anarquismo incipiente.

Na sua época – a viragem entre o séc. XIX e o séc. XX – assistia-se ao nascimento de sonhos e utopias, mas também de enganos e mal-entendidos.

Em Portugal, os monárquicos resistiam sem fé à deterioração do seu regime, e os republicanos acreditavam ingenuamente que bastaria destronar o rei para, num passe de mágica, o País reencontrar a sua antiga grandeza.

Noutro registo ideológico, encontravam-se os socialistas não marxistas, os socialistas marxistas liderados por Azedo Gneco, assim como os anarquistas libertários. Todos eles acreditavam que não bastaria acabar com a monarquia para melhorar as condições de vida do povo.

No entanto, enquanto os marxistas e os anarquistas radicais consideravam que o seu objectivo apenas seria conseguido através de uma profunda revolução, quiçá sangrenta, os socialistas não marxistas, também chamados “possibilistas”, acreditavam na possibilidade de mudar aos poucos, com pequenas reformas pontuais e dentro do regime existente.

Bartolomeu Constantino era um anarquista muito próximo dos possibilistas, que apelava à mudança com um mínimo de violência, através da educação das massas operárias. Frequentemente esteve próximo dos republicanos, que considerava aliados tácticos, atendendo que a destituição do rei era para ele, um primeiro passo positivo para a libertação e igualdade entre os homens.

Lutou pela criação de plataformas de entendimento entre possibilistas, anarquistas e republicanos, o que lhe valeu encarniçadas críticas dos anarquistas radicais e dos marxistas. Estes últimos, que não lhe perdoavam a independência e o grande protagonismo que tinha junto dos operários, acusavam-no frequentemente de estar mancomunado com a polícia e os capitalistas.

Devido ao seu esforço, primeiro fundou-se a União Socialista, em 1899, e depois a Federação Socialista Livre, em 1901. Esta última Federação era constituída por vários grupos autónomos em todo o País, havendo em Olhão o Núcleo Socialista “Sempre Avante” e em Quelfes o Grupo “Despertar”.

Em 1903 Bartolomeu Constantino deixa Lisboa e segue para o Algarve, onde aparece ligado ao Grupo “Libertos”, de Faro. Viu-se envolvido nos incidentes ocorridos nesta cidade, em Fevereiro de 1904, por ocasião da visita do primeiro-ministro João Franco. Acusado de ser organizador destes distúrbios, é preso em Junho de 1904, na Associação Marítima, onde residia e, posteriormente, julgado em Olhão no dia 4 de Agosto. É defendido por Afonso Costa (várias vezes futuro primeiro-ministro de Portugal durante a 1ª República) que se desloca ao Algarve. Afonso Costa é então coadjuvado por dois jovens advogados olhanenses que embora não partilhassem da ideologia do réu, acreditavam na sua inocência – João Lúcio e Carlos Fuzeta.

Este julgamento criou em todo o País um extraordinário movimento de solidariedade que abalou a monarquia, mas que não impediu que Bartolomeu Constantino tenha sido condenado à deportação perpétua para Timor. Após o julgamento, Afonso Costa apela da sentença e elogia Bartolomeu Constantino por ser “um operário humilde na sua vida, mas altivo nas suas ideias e crenças”, argumentando que “anarquista é-o, tal como foi Jesus”.

Apesar da pesada condenação, no início de Outubro de 1904, Bartolomeu é transferido para a cadeia de Lisboa, atendendo dois presos terem fugido da cadeia de Olhão uns dias antes, e em Julho de 1905 acaba por ser liberto devido à grande campanha nacional de solidariedade.

Passa a viver em Setúbal, onde instalou em 1906 um estabelecimento de comidas e bebidas e, em Junho de 1908, fixa residência em Almada (Mutela) onde participa activamente nas lutas sindicais da Federação Corticeira.


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Fotografia de 1912, fornecida pela bisneta (Dulce C.): da esquerda para a direita temos Bartolomeu Constantino, o seu filho mais novo, Lingg C. (com 7 anos), sua companheira, Júlia da Cruz (professora primária), seu filho mais velho, Antero C.Bartolomeu Constantino viria a ter ainda mais uma filha, Ana Constantino, nascida em Janeiro de 1914, em Chaves.

Teve um papel muito importante nesta região, durante a revolta que conduziu à proclamação da República em 5 de Outubro de 1910: perante o impasse momentâneo da revolta na véspera, em Cacilhas, Bartolomeu Constantino incita e arrasta os operários com o seu discurso inflamado. No dia seguinte, é um dos que proclamam a tão desejada República em Almada.

Após a República, promove o primeiro Congresso Anarquista português de 11 a 13 de Novembro de 1911 (na qualidade de secretário da Federação Anarquista da Região Sul) e dirige o jornal “Comuna Livre” (órgão da União Anarquista Comunista), sendo detido novamente em 1912. Depois da libertação passa a residir em Chaves e, em Janeiro de 1915, foi eleito para a Direcção da “União Operária Transmontana” e, em Agosto do mesmo ano, Secretário-Geral da União Anarquista Comunista. Regressa a Lisboa, sendo a sua última morada uma loja do Beco da Ricarda, nº 4, na freguesia do Sacramento.

Quando morre em 11 de Janeiro de 1916, na mais completa miséria, a emoção nas classes operárias foi enorme. Segundo os relatos do jornais da época, ao seu funeral ocorrido dia 16 de Janeiro no Cemitério dos Prazeres, assistiram mais de 20.000 pessoas e foi necessário construir oito tribunas para que usassem da palavra todos os oradores que lhe quiseram prestar a última homenagem. Terá sido o único grande revolucionário da época, que o foi sinceramente até à morte!

Em 1916, o Jornal O Setubalense anunciava que a sua antiga companheira – Júlia Cruz – e filhos agonizavam de fome num mísero quarto de Lisboa, sem cama para dormirem e um cobertor para se agasalharem! Este periódico abriu uma subscrição para ajudar a família de Bartolomeu Constantino, a que concorreu a esmagadora maioria do proletariado setubalense. Também alguns elementos da burguesia setubalense contribuíram na colecta, o que comprova o respeito que a memória de Bartolomeu Constantino granjeava, mesmo de sectores socialmente diferentes.

Sabemos que em 1917, Júlia da Cruz vivia em Lagos e recebia correspondência dirigida à União das Associações das Operárias de Lagos. Posteriormente,  aderiu ao Partido Comunista, passou a viver com um militante comunista – Alfredo Cruz – que chegou a estar preso no Tarrafal, de quem teve mais dois filhos.

Agradecemos comovidamente à família as fotografias e as informações que nos forneceram.

António Paula Brito

Fonte:



(memória libertária) José António Machado (“Graça”), um dos obreiros d’ “A Batalha” clandestina


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José António Machado, tipógrafo e jornalista, militante anarco-sindicalista,  na manifestação do 1º de maio de 1974 (?), em Lisboa. (aqui)

José António Machado (1916-1978), de origem operária, depois tipógrafo e jornalista, foi um dos militantes libertários que permitiram a existência de “A Batalha” clandestina, bem como de outra propaganda anarquista e anarco-sindicalista durante os tempos da ditadura.

Natural do Barreiro, onde nasceu em 1916, José António Machado começou a trabalhar aos 16 anos na indústria corticeira, passando depois para aprendiz da escola da tipografia da Imprensa Nacional. Autodidacta, dedicou-se ao estudo e difusão do esperanto e dos ideais libertários. Fez parte do grupo anarquista do Barreiro “Terra e Liberdade”, que na altura publicava um jornal com o mesmo nome.

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(biografia) Rui Vaz de Carvalho, 1941-2003


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Rui Vaz de Carvalho (1941-2003) foi um dos mais destacados e influentes militantes libertários da geração do pós-25 de Abril de 1974, que o “apanhou” na força da idade. Com uma sólida bagagem teórica, o Rui esteve sempre ligado aos mais diversos projectos editoriais, servindo também de elo entre os militantes mais velhos e os mais novos. Esteve ligado à Batalha, à Merda, à Voz Anarquista, à Acção Directa, à Antítese e à Utopia, bem como a diversos projectos direccionados para o ensino e para o teatro. Pouco tempo depois da sua morte, José Maria Carvalho Ferreira traçava a sua biografia na revista Utopia, nº 16, de 2003, revista de cuja equipa redactorial fazia parte quando se deu o seu desaparecimento.

“Sejamos optimistas, deixemos o pessimismo para melhores tempos!” (texto de Júlio Carrapato sobre Gabriel Morato)


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O funeral de Júlio Carrapato realiza-se esta sexta-feira, pelas 14h, para o cemitério de Faro. Em jeito de última homenagem, de entre as largas dezenas de textos que podíamos ter escolhido, seleccionámos este artigo, publicado em Outubro de 2005 na revista “Algarve Mais” evocativo da morte, poucas semanas antes, de um outro anarquista de referência no meio libertário português, de que foi amigo próximo e companheiro, em França e em Portugal, nomeadamente no grupo fundador da revista anarquista “Acção Directa”. Neste artigo, Júlio Carrapato revela de forma bem clara a amizade entre os dois libertários, uma amizade baseada na solidariedade e no respeito mútuo entre companheiros, e também fornece alguns elementos para uma melhor compreensão dos relacionamentos políticos e pessoais na época a que o texto se refere – anos 70, antes e depois do 25 de Abril.

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“Sejamos optimistas, deixemos o pessimismo para melhores tempos!”

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À MEMÓRIA DE JOÃO GABRIEL DE OLIVEIRA MORATO PEREIRA (1940-2005)
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Morreu o João Gabriel Morato Pereira, o nosso Gabriel, como lhe chamávamos nos vários círculos do movimento libertário português, movimento cuja sobrevivência ele garantiu com mais um punhado de resistentes como Rui Vaz de Carvalho ou Antonio Mota, e que tanto lhe ficou a dever em vários momentos decisivos do pós-25 de Abril de 1974. Ele próprio, porém, a despeito de uma perseverança, de uma pertinácia e de uma firmeza à prova de bala, não resistiu a mais uma cirurgia ao coração (válvula mitral) e uma embolia cerebral, desgraçadamente sobrevinda durante o famigerado período pós-operatório, deitou-o por terra, fulminou-o, no dia 19 de Julho de 2005, à beira dos 65 anos, já que nascera em 28/07/1940. Por mais um capricho da vida, no próprio dia em que eu festejava os meus provectos 58 anos, morria-me um dos meus maiores e mais constantes amigos, deixava de bater aquele coração grande e generoso e de pulsar aquela inteligência clara. Lúcido até o fim, sempre animado por aquela lucidez apaixonada e revolucionária que nada tem a ver com a frieza ou a rigidez cadavérica, precisamente porque é a antítese da morte, era a prova viva de que a razão e emoção não se opõem, e menos ainda se excluem,conforme no-lo ensinam os modernos neurologistas, estudiosos da actividade cerebral e dos processos físicos e psíquicos, porque também se pensa com o corpo. Era, em suma, um homem sensível, porque inteligente, e inteligente porque sensível, e a sua morte revoltante deixou-nos a todos imensamente mais pobres, constituindo mais uma prova da inexistência de Deus, como diria Sébastien Faure. E de nada serve que os materialistas toscos e os “socialistas” arregimentadores, homogeneizadores e massificadores, aparentemente por outro lado, nos venham cá dizer com gélidas inflexões que “ninguém é insubstituível”. Nós anarquistas, que lutamos por uma sociedade de indivíduos (homens e mulheres) livres e iguais, mas únicos e variados, sabemos , pelo contrário, que jamais alguém é substituído,quanto mais o Gabriel! Pode-se, é claro, se for o caso, “ganhar” com a“troca”, mas o conceito de substituição é em si mesmo absurdo e obsceno…

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(livros) “Lutas dos moradores no pós-25 de Abril” e a “Biografia de Agostinho da Silva” para breve nas livrarias


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«Sem Mestres Nem Chefes o Povo Tomou a Rua. Lutas dos Moradores no Pós-25 de Abril», de José Hipólito dos Santos

Apresentação Pública sexta-feira, dia 30 de Janeiro, no Bar de “A Barraca” (Lisboa), às 18,30H

«Ainda em Abril de 1974, moradores de um bairro camarário no Porto designaram uma comissão para acabar com o regulamento municipal, denunciando-o como meio de intromissão abusiva na vida dos moradores, que atenta contra os princípios de dignidade e de liberdade. E, bem conscientes de que não bastava exigir, incitaram outros bairros a fazer o mesmo. Nos dias seguintes, realizaram-se reuniões em todos os bairros e rapidamente se constituíram comissões de moradores, as primeiras de um movimento imparável e que se tornou nacional.»

Prefácio de Rui Canário
230 páginas
12 euros

aqui: http://www.letralivre.com/noticias/detalhes.php?id=271

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“O Estranhíssimo Colosso , Uma Biografia de Agostinho da Silva”, de António Cândido Franco

Agostinho da Silva é um dos maiores filósofos portugueses e uma figura singular e interveniente na sociedade e na cultura do século XX. A sua obra centra-se na ideia de liberdade como atributo supremo da condição humana. «[…] os passos numa aldeia da raia, os estudos na Invicta, os primeiros amores, os trabalhos em Lisboa, as investigações em Paris e em Madrid, as paixões em São Paulo, os entusiasmos em Montevideu, as estranhezas em Buenos Aires, os recolhimentos em Itatiaia, os estudos no Rio, as aulas em Niterói, as campanhas na Paraíba, as descobertas no Ibapuera, as ações em Santa Catarina e na Baía, os novos amores em Brasília, as realizações no Japão, em Timor e em Nova Iorque, os empenhos na Galiza, as explosões em Sesimbra, Monsaraz e Príncipe Real, a participação na Revolução dos Cravos e no novo Portugal livre. Ficou ainda a obra colossal, que o génio do seu espírito, a agilidade da sua mão, a acutilância do seu pensamento nos legou […]. Quem foi George Agostinho Baptista da Silva? A resposta é infinita, tantos os ângulos esquinados desta vida: prosador de altíssimos dons, narrador inventivo, cronista subtil, biógrafo monumental, pedagogo de largo esforço, monitor de fina manha, professor de sucesso, pensador destemido, poeta bissexto, gramático de muita língua, estoico severo, homem de desleixada túnica, entomologista, tradutor, criador do Centro de Estudos Afro-Orientais, escândalo bíblico, trickster, ogã de terreiro baiano, patriarca de larga tribo, povoador, amante, perrexil, poliglota, sonhador, farsante, polígamo, explicador, joaquimita, gato, galo, sábio, escuteiro, pop-star, colosso, bandeirante, franciscano anormal, homem do tá-tá-tá, aprendiz de valsa, cidadão do mundo, aldeão antigo, monstro, vadio truculento, marau divino, criança eterna, biógrafo de Miguel Ângelo, homem de cinco cabeças e 10 instrumentos […], o otimista, o entusiasta, sem a mais pequena mancha de desânimo no futuro.

O autor da biografia de Agostinho da Silva, cujo pensamento libertário tem vindo a ser cada vez mais sublinhado, é o professor, ensaísta e poeta António Cândido Franco, director da revista de cultura libertária “A Ideia” e colaborador assíduo de “A Batalha”.

A edição é da Quetzal e estará à venda nas livrarias a partir do dia 13 de Fevereiro.

http://quetzal.blogs.sapo.pt/o-estranhissimo-colosso-470028