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Daniel Colson: “O anarquismo é extremamente realista”


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O ressurgimento do movimento libertário, que está hoje no centro e no coração da maioria dos movimentos sociais através das formas organizativas (assembleias, horizontalidade, igualdade, crítica das hierarquias e da representação) e dos instrumentos de luta (acção directa, apoio mútuo, solidariedade efectiva), tem tido também um paralelismo evidente ao nível teórico e mais académico. O anarquismo, que tinha estado quase sempre arredado do meio intelectual, forçou as portas da Universidade e dos gabinetes de investigação e é hoje objecto de estudo, de discussão, de seminários e de artigos em revistas de filosofia, antropologia, sociologia, etc., etc.. Do mesmo modo, nos últimos anos, tem surgido um grande número de novos autores, em geral investigadores comprometidos com a prática libertária, que têm aberto novas janelas de debate e discussão, renovando e dando actualidade ao pensamento libertário. O Portal Anarquista tem tentado dar voz, dentro das nossas possibilidades, a estes novos (ou menos novos) autores, traduzindo textos e divulgando-os. Carlos Taibo, David Graeber, Tomas Ibañez, Gabriel Kuhn, Octavio Alberola, etc., têm sido alguns dos autores, nossos contemporâneos, divulgados nesta página. Neste sentido, publicamos agora a tradução de uma entrevista que o filósofo e historiador anarquista Daniel Colson deu à revista francesa Ballast, em Fevereiro de 2015 e cuja versão (reduzida) em castelhano foi publicada há dias pelos jornal espanhol “el diário”. Uma entrevista interessante, que define bem o campo do anarquismo face às ideologias estatistas e de carácter autoritário, e em que Daniel Colson, citando Deleuze e Guatarri define Anarquia como “uma estranha unidade que apenas se diz do múltiplo”

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Propões a ideia de que o anarquismo não é apenas um modo de viver, nem um estado de alma, mas sim uma verdadeira ontologia. Que queres dizer com isto?

colson-300x300Falar de ontologia é falar do que é, do que há, das coisas, dos factos – a dominação por exemplo, a hierarquia, a exploração, a opressão, a tristeza (para nos situarmos apenas nos factos negativos – mas é verdade que há muitos mais). Ao contrário do que se pensa frequentemente (alguns libertários também o fazem), o anarquismo não é um ideal ou uma utopia, ou “belas ideias” que todos os dias se constataria que são irrealizáveis. O anarquismo é extremamente realista. Fala das coisas tal e qual elas são: o caos, os acidentes, a vida e a morte, a alegria, mas também a tristeza e o sofrimento, o stress, as relações de força e de poder, o acaso e a necessidade, tanto da existência humana como do mundo e do universo que são os nossos. Em síntese, a “anarquia” do que existe. O idealismo e a utopia não estão do lado do anarquismo, mas sim do lado da ordem, das aparências e dos formatos da coerção e da dominação. O idealismo e a utopia estão do lado das “leis”, das “religiões”, dos “Estados” e dos sistemas (incluindo os científicos) que pretendem pôr ordem e dar sentido ao caos, vergá-lo à sua lógica particular, à custa de muitos sofrimentos, negações, violências e obrigações – ao mesmo tempo que estas leis, estas religiões, estes Estados e estes sistemas em luta feroz pela hegemonia das suas mentiras e das suas vontades são eles próprios o sinal mais visível (mas também evidente) do que é que pretendem combater e vergar às suas leis particulares.

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Voltando a David Graeber: “Dívida sempre foi uma questão de poder”


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Guilherme Freitas entrevista David Graeber no Globo

Em setembro de 2011, o antropólogo americano David Graeber estava no grupo que planejou um acampamento coletivo no Parque Zuccotti, em Nova York, para protestar contra a desigualdade econômica. Foi o início do movimento Occupy Wall Street, que nos meses seguintes mobilizou milhares de pessoas e colocou em circulação slogans como “Nós somos os 99%”. Até então um acadêmico pouco conhecido, autor de uma pesquisa de campo no arquipélago africano de Madagascar, Graeber havia publicado meses antes o livro “Dívida: os primeiros 5.000 anos” (Três Estrelas), que se tornou um inesperado best-seller ao retratar a história da economia do ponto de vista da relação entre credores e devedores. Graeber falou ao GLOBO por e-mail sobre o livro, que chega ao Brasil ao mesmo tempo que “Um projeto de democracia” , seu ensaio sobre a história e o legado do Occupy Wall Street. (Outras Palavras, 8 de Abril de 2016)

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Portal Anarquista:”A desilusão com o actual sistema político vai trazer mais gente para o campo libertário”


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Terminamos hoje a publicação das respostas solicitadas junto dos órgãos que integram a Rede de Informação Alternativa. Há um ano atrás quatro projectos e canais informativos, na web e em papel, juntaram-se e criaram uma rede de partilha e troca de informações. Guilhotina.info, jornal Mapapt.indymedia e Portal Anarquista formam esta rede que, apesar de todas as dificuldades, pretende romper o gueto informativo em que a comunicação e a informação anti-autoritárias, de base assemblearia, sempre tem vivido em Portugal. Como base para um artigo a ser publicado na próxima edição do jornal “A Batalha” sobre a Rede de Informação Alternativa pedimos a cada um destes projectos a resposta a um pequeno questionário. Depois do jornal MAPA, da Guilhotina.info e do pt.Indymedia, publicam-se agora as respostas do Portal Anarquista.

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Quando, como e porquê surgiu o Portal Anarquista?

O Portal Anarquista, com visibilidade na web (blog com perto de 700 mil visitas, e página no facebook com mais de 6 mil gostos), apareceu durante o ano de 2013, depois da extinção do Colectivo Libertário de Évora, constituído um ano antes. Aproveitando a experiência jornalística de alguns dos seus elementos, o Portal Anarquista assume-se como um espaço informativo e de memória libertária, pretendendo constituir-se como um elo de ligação entre os vários núcleos libertários actuando em Portugal e no Brasil, ao mesmo tempo que procura recuperar a história e a memória do movimento libertário nos países que usam o português como língua oficial.

De facto, notámos que apenas uma parte muito pequena de materiais anarquistas, referentes ao movimento em Portugal, estava na web e decidimos intervir nesse sentido, publicando e disponibilizando todos os materiais, a que fomos tendo acesso, na internet. Ao mesmo tempo procuramos traduzir para português os posicionamentos das diversas estruturas internacionais ligadas ao movimento libertário, bem como os artigos e as publicações dos mais diversos autores – conhecidos ou não – de cariz anti-autoritário.

O Portal Anarquista dá também destaque à agenda libertária e anti-autoritária, servindo igualmente de veículo informativo em cima dos acontecimentos, sempre que necessário (nomeadamente através do facebook e do twitter).

Como vêem hoje a informação alternativa em Portugal?

A informação alternativa ainda tem características muito residuais em Portugal, ao contrário do que acontece no Estado Espanhol, França ou Itália. No entanto, a difusão da internet e das várias redes sociais tem possibilitado a criação de espaços informativos sobre os movimentos sociais, com informação actualizada e em primeira mão, permitindo uma alternativa aos órgãos de comunicação do sistema. É preciso, agora, consolidar esses projectos, dar-lhes maior visibilidade e pô-los em rede, articulando-os, de forma a que se crie um real espaço informativo alternativo, ao serviço dos movimentos sociais de base, autogestionários e horizontais – os únicos que têm possibilidade de transformar a sociedade.

O espaço alternativo e assembleário constituiu-se em Portugal (e Espanha) nos últimos anos em torno dos movimentos de rua e de ocupação de espaços públicos. Houve manifestações aguerridas, que hoje parece não ter condições para se repetirem. Como vêm actualmente este movimento assembleário, de junção de lutas, e alternativo ao sistema representativo vigente?

A luta social em Portugal tem conhecido uma pausa relativa nos últimos tempos sobretudo devido à constituição da maioria Costa, Catarina & Jerónimo. A tutela dos sindicatos e de alguns movimentos sociais pela esquerda tradicional tem ainda muito peso, pelo que a participação do PCP e do BE no apoio ao governo do PS tem retirado algum ímpeto à contestação social. No entanto, a constatação que vai sendo feita pelos trabalhadores mais conscientes de que esta solução governativa representa mais do mesmo e que não constitui qualquer alternativa para a construção de uma sociedade diferente, sem exploração nem opressão, torna-se cada vez mais evidente. Também o agravamento da situação económica e financeira do país e as repetidas notícias da corrupção e do nepotismo que tem envolvido grande parte da classe política e empresarial (uma e outra são a mesma coisa) têm permitido uma maior consciencialização por parte de muitos trabalhadores de que o jogo político não é alternativa ao actual estado de coisas. Espera-se – e nós lutamos por isso – que esta desilusão sobre o sistema político vigente faça surgir formas organizativas de índole anarco-sindicalista e mobilize os trabalhadores mais activos e determinados para o campo libertário.

Perspectivas futuras para os movimentos anti-autoritários, horizontais e de acção directa em Portugal? E para a comunicação social alternativa?

Penso que são positivas. Findo o modelo soviético de exploração e opressão, acabadas também que estão as ilusões sobre o modelo do capitalismo neoliberal e esgotado que está o sistema democrático tradicional, assente no jogo eleitoral e parlamentar, os projectos de base, de índole social, autogestionários, federalistas e de acção directa tornam a estar na ordem do dia, reforçando o peso das correntes libertárias e anti-autoritárias nos mais diversos sectores sociais.

Para que tal aconteça são necessários também órgãos e canais informativos alternativos, que criem pontes e solidariedades. Um e outro movimento, o social e o da criação de redes de informação, caminham par a par e alimentam-se mutuamente. Um não pode existir sem o outro.

O que é que os vossos meios ganharam com a constituição da Rede de Informação Alternativa? Projectos futuros.

A Rede de Informação Alternativa tem sido muito importante na divulgação de iniciativas e tomadas de posição diversas, ampliando o universo de activistas que conseguimos alcançar. É um esforço comum que, numa área onde é sempre difícil consolidar projectos conjuntos, mostra a necessidade de avançarmos ainda mais neste sentido e de congregarmos esforços para que a nossa mensagem passe e chegue a mais gente.

Entre os projectos futuros, que temos entre mãos, está a edição de um jornal digital, com actualização diária, que colija e disponibilize a informação alternativa dispersa na rede e noutros colectivos editoriais, de raiz libertária, que têm vindo a surgir.

pt.indymedia: “A social-democracia da troika Costa-Catarina-Jerónimo é ainda um momento do capitalismo”


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Há um ano atrás quatro projectos e canais informativos, na web e em papel, juntaram-se e criaram uma rede de partilha e troca de informações. Guilhotina.info, jornal Mapapt.indymedia e Portal Anarquista formam esta rede que, apesar de todas as dificuldades, pretende romper o gueto informativo em que a comunicação e a informação anti-autoritárias, de base assemblearia, sempre tem vivido em Portugal. Como base para um artigo a ser publicado na próxima edição do jornal “A Batalha” sobre a Rede de Informação Alternativa pedimos a cada um destes projectos a resposta a um pequeno questionário. Depois do jornal MAPA, da Guilhotina.info e agora do pt.Indymedia, seguir-se-ão as respostas do Portal Anarquista.

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Quando, como e porquê surgiu o indymedia?

O indymedia surgiu nos inícios de 2000, inspirado na rede indymedia que “nascera” meses antes em Seattle (Estados Unidos), ainda sob a designação azine.org e sem a possibilidade de publicação livre. Cerca de um ano e pouco depois aderiu à rede Indymedia, embora anos mais tarde o projecto tenha sido quase abandonado e ficado parado durante uns tempos.

O pt.indymedia actual surgiu a 30 de Novembro de 2009. Depois de alguns anos sem um indymedia em Portugal, um grupo de companheiras decidiu reactivar o site por considerar ser uma ferramenta fundamental para dinamizar a informação alternativa, nomeadamente ao permitir uma publicação sem censura por parte de todas as que se movem por um mundo mais justo e solidário, num servidor que não está nas mãos de grandes corporações

Como vêem hoje a informação alternativa em Portugal?

Consideramos que, com a explosão dos blogs e redes sociais, houve um enorme incremento de projectos informativos que procuram uma informação alternativa aos media mainstream. Na sua globalidade, parecem-nos projectos sérios e coerentes. De salientar também o surgimento de alguns projectos em papel. No entanto, consideramos que ainda falta muito para que essa informação alternativa ultrapasse os guetos onde nasceu e de onde pretende sair. E que lhe falta a capacidade de criar agenda(s) própria(s) em vez de ir atrás das agendas dos media empresariais.

O espaço alternativo e assembleário constituiu-se em Portugal (e Espanha) nos últimos anos em torno dos movimentos de rua e de ocupação de espaços públicos. Houve manifestações aguerridas, que hoje parecem não ter condições para se repetirem. Como vêem actualmente este movimento assembleário, de junção de lutas, e alternativo ao sistema representativo vigente?

Esse espaço, que na sua génese teve ideias interessantes do ponto de vista das formas políticas de agir e decidir, foi rapidamente tomado pelos aparelhos partidários, no caso português, ou transformado em partido político, no caso espanhol. No Porto, por exemplo, o Bloco de Esquerda não se inibiu de apresentar uma candidatura à Câmara Municipal, em que palavras como assembleia e colectivo estavam muito presentes, numa tentativa de lucrar com as saudades e o vazio deixado pelo Es.Col.A da Fontinha.

Parece-nos, no entanto, que este tipo de espaços são essenciais para a criação de uma política autónoma e anti-autoritária, mas terão que se desenvolver num processo mais local, como bairros e ruas, podendo, posteriormente, discutir com outras assembleias e procurar pontos comuns de luta. E levantando travões permanentes à entrada dos aparelhos partidários.

Perspectivas futuras para os movimentos anti-autoritários, horizontais e de acção directa em Portugal? E para a comunicação social alternativa?

Os movimentos anti-autoritários, horizontais e de acção directa deveriam ter um papel fundamental em altura de governo de esquerdas. Para manter o espírito de crítico aceso e para relembrar que a social-democracia da troika Costa-Catarina-Jerónimo é ainda um momento do capitalismo que o legitima mais do que pretende ultrapassar ou destruir. No entanto, entre uma esquerda que não pode falar e um movimento autónomo/anarquista demasiado virado para os seus espaços, haverá um tempo sem grandes lutas sociais.

Num momento que não distará muito, o perigo será – novamente – o dos movimentos autónomos não deixarem as suas práticas e as suas ideias serem colonizadas pelos aparelhos partidários ,que – mais uma vez – deverão voltar às loas sobre participação, horizontalidade, luta, democracia verdadeira e quejandos, assim que o cheiro das cadeiras do poder se começar a desvanecer.

A comunicação social alternativa terá o papel fundamental de trazer para o dia apenas a luz e as perspectivas que interessam a quem luta, permitindo que haja um contraponto visível à invisibilidade provocada pelo excesso de informação com que nos bombardeiam televisões, jornais e facebooks ou twitters.

O que é que o pt.indymedia ganhou com a constituição da Rede de Informação Alternativa?

Ganha-se sempre muito com a criação de redes de proximidade ideológica. É uma forma rica de manter as autonomias procurando pontos comuns e desenvolvê-los em função das necessidades e objectivos de todos os projectos envolvidos. O pt.indymedia está neste momento a criar um site novo, procurando corrigir os erros que teimam em persistir neste site actual e que prejudicam a dinâmica para a qual foi criado, sendo a possibilidade de publicação aberta a ferramenta que mais tem sido prejudicada.

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Guilhotina.info: “De nada vale ser um puritano conceptual e um inútil na prática”


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Há um ano atrás quatro projectos e canais informativos, na web e em papel, juntaram-se e criaram uma rede de partilha e troca de informações. Guilhotina.info, jornal Mapapt.indymedia e Portal Anarquista formam esta rede que, apesar de todas as dificuldades, pretende romper o gueto informativo em que a comunicação e a informação anti-autoritárias, de base assemblearia, sempre tem vivido em Portugal. Como base para um artigo a ser publicado na próxima edição do jornal “A Batalha” sobre a Rede de Informação Alternativa pedimos a cada um destes projectos a resposta a um pequeno questionário. Começamos agora a publicar as respostas recebidas. Depois do jornal MAPA e agora da Guilhotina.info, seguir-se-ão as da pt.Indymedia e Portal Anarquista.

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Quando, como e porquê surgiu a Guilhotina.info?

No Verão de 2013, a convite de activistas do 15M (Espanha), várias pessoas ligadas a projectos de comunicação portugueses, tais como Indignados Lisboa, Democracia Verdadeira Já e Ministério da Verdade, participam numa semana de partilha de conhecimentos e aprendizagens nos arredores de Madrid.

Lá descobrem alguns factos interessantes. Primeiro, que já se conheciam todos indirectamente via troca de conteúdos entre os diferentes projectos.

Segundo, que ninguém na Itália, Grécia, Espanha e Irlanda faz a mínima ideia do que se passa em Portugal. Quanto ao vice-versa, já sabíamos ser o caso.

Terceiro, que ainda tínhamos muito a aprender em termos do uso criativo da Internet para comunicação e coordenação, tendo em conta todos os projectos interessantes dos companheiros do Estado Espanhol.

Decidimos então que esta era a oportunidade perfeita para conjugarmos o nosso trabalho, as nossas preocupações em estabelecer pontes de comunicação internacionais (daí o bilinguismo) e tudo o que havíamos aprendido num só projecto. Nasce a Guilhotina.info.

Como veêm hoje a informação alternativa em Portugal?

Ainda pequena, frágil, inconstante…, mas se estiver nas mãos de um grupo de pessoas motivadas e ambiciosas, ainda que trabalhem conforme a sua disponibilidade, pode permitir criar verdadeiras alternativas de informação, capazes de fazerem estragos.

O espaço alternativo e assembleário constituiu-se em Portugal (e Espanha) nos últimos anos em torno dos movimentos de rua e de ocupação de espaços públicos. Houve manifestações aguerridas, que hoje parece não terem condições para se repetirem. Como veêm actualmente este movimento assembleário, de junção de lutas, e alternativo ao sistema representativo vigente?

É preciso ir para além do assemblearismo puramente pelo assemblearismo e parar de tentar recriar o 15M. O momento de 2010-2012, ligado à politização de uma geração que subitamente se viu privada de todas as certezas que lhes tinham sido prometidas pelo pacto social, já passou. Ao lançarem-se novas iniciativas que tomem a assembleia como modelo de organização (ao contrário de um fim em si) é preciso que estas estejam ligadas a lutas específicas (habitação, saúde, educação, etc.), em coordenação com espaços específicos (bairros, universidades, locais de trabalho), ou estarão condenadas a uma rápida dispersão derivada da desmoralização com a falta de resultados concretos, objectivos vagos e guerras internas que daí derivam. Este modelo sofre também com a guerra externa levada a cabo pelo aparelho repressivo, que já aprendeu a não dar tempo à ocupação do espaço público antes de passar ao ataque.

Perspectivas futuras para os movimentos anti-autoritários, horizontais e de acção directa em Portugal? E para a comunicação social alternativa?

Continua a grassar uma enorme falta de capacidade de aprendizagem e de auto-disciplina nos movimentos em Portugal. Fazer parte de um movimento anti-autoritário e horizontal não é uma desculpa para cada um fazer o que lhe dá na cabeça, achando que vai dar tudo ao mesmo – se aparece ou não nas reuniões, se cumpre as suas tarefas ou não, conforme o apetite do momento.

É preciso que quem aspira a estar presente nestes movimentos, primeiro que tudo, estude movimentos idênticos,que partilham ambições semelhantes  e que, ao mesmo tempo, conseguiram alcançar vitórias. Como se estruturam? Como cresceram? Quais as suas tácticas e estratégias? E por aí fora. De nada vale ser um puritano conceptual e um inútil na prática.

O que é que os vossos meios ganharam com a constituição da Rede de Informação Alternativa? Projectos futuros.

A rede de informação alternativa foi para nós um primeiro passo para abrir linhas de comunicação entre diferentes projectos que achámos interessantes e com os quais gostaríamos de colaborar. Já deu frutos na forma de partilha de conteúdos, rapidez de resposta na coordenação, assim como na organização de eventos, tal como o encontro em Coimbra no qual participaram também a La Directa, Periodico Diagonal e Radio Vallekas, oriundos do Estado Espanhol.

Conforme os diferentes projectos vão ganhando estabilidade e reforçando os seus meios e contactos, abrir-se-ão mais oportunidades para colaboração entre estes.

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Jornal MAPA: “A comunicação social alternativa deve ter a capacidade de pôr em contacto as diferentes formas de lutar e criar”


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Há um ano atrás quatro projectos e canais informativos, na web e em papel, juntaram-se e criaram uma rede de partilha e troca de informações. Guilhotina.info, jornal Mapa, pt.indymedia e Portal Anarquista formam esta rede que, apesar de todas as dificuldades, pretende romper o gueto informativo em que a comunicação e a informação anti-autoritárias, de base assemblearia, sempre tem vivido em Portugal. Como base para um artigo a ser publicado na próxima edição do jornal “A Batalha” sobre a Rede de Informação Alternativa pedimos a cada um destes projectos a resposta a um pequeno questionário. Começamos agora a publicar as respostas recebidas. Depois do jonal MAPA, seguir-se-ão as da Guilhotina.info, pt.Indymedia e Portal Anarquista.

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Quando, como e porquê surgiu o jornal MAPA ?

O jornal MAPA nasce em Dezembro de 2012, fruto da vontade de algumas pessoas, envolvidas já há anos em grupos ou acções anarquistas, em terem um meio de comunicação regular, generalista e acessível a qualquer pessoa. Algumas das necessidades que identificámos e que levaram à criação do jornal foram: a falta de projectos de informação crítica, não partidários; a falta de cuidado com a linguagem e a estética de vários projectos à nossa volta; a vontade de criar um jornal em papel (para além da difusão digital dos mesmos conteúdos) não propagandista, baseado mais no mapeamento de problemas e denúncia dos estragos do capitalismo, em vez de fazer a apologia de certos ideias ou políticas como a solução para os problemas atuais.

Como vêem hoje a informação alternativa em Portugal?

Hoje em dia existem alguns projectos formais de informação alternativa que se organizam em torno de colectivos como o MAPA ou a Guilhotina.info, por exemplo, mas existe um forte contributo, não apenas em Portugal, de grande escala, potenciado pelas redes sociais como o Twitter ou o FB e que constituem uma autêntica fonte de informação alternativa. Em momentos de crise social, e não só, é às comunidades e aos seus membros que estão mais “online” que recorremos para saber o que se passa e, mais do que isso, para perceber as diferentes narrativas que vão desde o que dizem os media oficiais ao que se passa efectivamente nas ruas.

No entanto, o facto de termos uma imprensa muito caracterizada pelos CMs e jornais parecidos faz com que seja essencial a existência de mais projectos que publiquem análises, reportagens e notícias bem fundamentadas e que não sejam a voz dos partidos ou da polícia. Portugal tem um número destes projectos incrivelmente pequeno quando comparado com Espanha ou França.

O espaço alternativo e assembleário constituiu-se em Portugal (e Espanha) nos últimos anos em torno dos movimentos de rua e de ocupação de espaços públicos. Houve manifestações aguerridas, que hoje parece não terem condições para se repetirem. Como vêm actualmente este movimento assembleário, de junção de lutas, e alternativo ao sistema representativo vigente? Que perspectivas futuras para os movimentos anti-autoritários, horizontais e de acção directa em Portugal? E para a comunicação social alternativa?

O momento que vivemos é de excepcional paz social controlada por aqueles que, antes, se encontravam na oposição, ou seja, a esquerda. No entanto, parece que, pelo resto do mundo, a crise social e política impõe-se de forma determinante, e disso são exemplo os protestos contra a Loi Travail recentemente, em França. Por cá, não podemos, regra geral, pensar nos mesmos termos ou forçar as comparações.  Também em Portugal existe uma profunda crise social, económica e ecológica que nos querem vender como solúvel a partir das soluções políticas e governamentais da geringonça. Mas parece-nos que as soluções surgem justamente noutros campos onde diversos movimentos desempenham um papel importante.

A comunicação social alternativa deve conseguir manter um olhar fixo sobre todas as experiências que apresentam visões horizontais de organização social, tanto sobre as que se organizam para lutar, como sobre as que se organizam para construir. No entanto, o importante é justamente fazer as pontes, ainda pouco construídas, entre diversas propostas e abordagens. A comunicação social alternativa deve ter esta capacidade de pôr em contacto as diferentes formas de lutar e criar.

O que é que o MAPA ganhou com a constituição da Rede de Informação Alternativa?

Em primeiro lugar, todos os projectos ganham com as parcerias e a as partilhas de conhecimento. Por outro lado, a criação de um espaço de debate para pensar a informação que fazemos é essencial se queremos continuar a desenvolver este tipo de projectos. Existe a possibilidade de coordenação e junção de esforços (mesmo que pouco explorada) para campanhas e momentos específicos, o que no caso da rede de informação alternativa tem particular interesse já que é composta por projectos que têm formatos diferentes (papel, site, fb, etc., etc.).

(Yannis Youlountas) “A democracia é a pré-história da anarquia”


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A democracia é a pré-história da anarquia

Entrevista com Yannis Youlountas (*)

Depois de “ Ne vivons plus comme des esclaves” en 2013, Yannis Youlountas acaba de lançar um novo filme : “Je lutte donc je suis”. Uma ode à resistência e à insubmissão que decorre de novo na Grécia, mas também, desta vez, em Espanha. Uma viagem musical através das alternativas concretas, autogestionária e libertária que lembra que a utopia já aí está, ao alcance da mão. Um convite a romper com a rotina e a obediência, as ideias recebidas e a existência despossuída de si própria: como diz um dos personagens do seu novo filme “eu luto porque penso que a humanidade é capaz de outra coisa”.

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