Abaixo-assinado contra a perda de direitos e liberdades na Europa em nome da luta “contra o terrorismo”


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Foi hoje divulgado um manifesto em defesa das liberdades civis na Europa, assinado por diversas personalidades, entre as quais Noam Chomsky e aberto à assinatura de todos que assim o queiram fazer. Tendo como base os últimos acontecimentos em Espanha (a prisão dos dois marionetistas) e em França (o estado de excepção), o manifesto apela “à inviolabilidade efectiva dos direitos de liberdade de expressão, manifestação, associação e reunião” e que se ponha termo à deriva securitária que está em curso em muitos países europeus.

Apesar de não concordarmos com algumas passagens do manifesto – em especial a referência aos “nossos representantes políticos na Europa”, que mais do que a solução para os problemas europeus têm sido eles próprios “o problema”  e o facto do manifesto não apelar directamente aos povos e aos trabalhadores da Europa, mas sim aos governos e aos Estados para se oporem a esta deriva autoritária, gerada pelos próprios Estados e governos a que se apela – julgamos que este é um texto importante para denunciar a situação de perda de direitos e de liberdades a que estamos a viver hoje por toda a Europa, Portugal incluído.

O manifesto, que publicamos em seguida, traduzido para português, pode ser subscrito por qualquer pessoa em  www.porlaslibertadesciviles.org

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Protesto contra la Lei Mordaça en julho de 2015 em Madrid / JUAN ZARZA / DISO PRESS

Pelas liberdades civis em Espanha e na Europa

Pela liberdade sem acusação dos marionetistas

“A Europa marcha para a sua decadência. O continente que pretendeu emergir do pós-guerra como garante das liberdades e direitos civism está-se afundar na naturalização da barbárie e no vazio de uma forma de governo crescentemente autoritária. Enfrentada a crise mais severa da sua história recente, escolheu o pior dos caminhos, pondo em prática políticas que julgávamos erradicadas.

Em termos económicos, a austeridade no conduziu à prometida recuperação do crescimento. Pelo contrário, parece que nos veremos obrigados a atravessar um largo período de estagnação, de crescimento das desigualdades e de concentração da riqueza. Por sua vez, e face ao crescente descontentamento interno, muitos países da União apostaram numa política desinibidamente repressiva. Que se observa na redução da tolerância institucional para os protestos, na construção recorrente da figura do “inimigo interno” e na centralidade da “guerra contra o terror” como substituto do princípio legítimo do direito à segurança. Prova desta tendência é a indiferença cruel, quando não a óbvia criminalização, com que os Estados europeus tratam as populações africanas e do Médio Oriente, que fogem de conflitos nos quais a União parece ter não pouca responsabilidade.

Até a própria França, noutro tempo um formidável espaço de conquista de liberdades e direitos, tornou-se um laboratório de um novo modelo destinado a limitar as liberdades civis. Face ao avanço da extrema-direita interna e aos atentados do islamismo radical, um governo socialdemocrata apoiou-se no carro do governo securitário e do Estado de emergência. O mesmo sucedeu na Bélgica. E nos países da Europa do Leste encontramos exemplos de governos ainda mais radicalizados (para o pior), como a Polónia

A Espanha não ficou à margem desta sinistra tendência à restrição de direitos e liberdades. Ainda que as liberdades civis fossem a parte mais reconhecida e desenvolvida no segundo capítulo da Constituição, as sucessivas mudanças do Código Penal e o uso político da judicatura foram fazendo uma restrição cada vez mais restritiva das liberdades fundamentais. Assim aconteceu nestes últimos dias, com a declaração da Audiência Nacional e a prisão preventiva dos dois marionetistas pelo simples facto de interpretarem uma obra de ficção na rua. Também, recentemente, assistimos à realização do julgamento dos “8 de Airbus”, todo um sumário político contra o direito à greve e que afecta os cerca de trezentos acusados por este motivo.

São apenas dois casos que se somam às sucessivas mudanças da legislação, como a recente lei de segurança cidadã, também chamada “Lei Mordaça”, que permite as “buscas preventivas”, blinda a autoridade policial face à palavra dos acusados e generaliza as multas para factos não tipificados com conteúdos claros, permitindo o arbítrio e a discricionariedade. Esta lei constitui a última das modificações punitivas e restritivas de direitos realizada e que se junta às sucessivas modificações do Código Penal.

Conscientes de que sem direitos civis não existe sequer o alicerce mínimo de uma democracia, e ante a preocupação por uma rápida involução até ao autoritarismo em muitos países da União, os abaixo-assinados exigimos aos nossos representantes políticos na Europa que trabalhem pelo reconhecimento e ampliação do direito europeu ao asilo e que se estabeleça algum tipo de carta que, ao nível do continente, blinde os direitos civis.

Nesta linha, mas em relação com a legislação e a arquitectura institucional espanhola, exigimos:

#A inviolabilidade efectiva dos direitos de liberdade de expressão, manifestação, associação e reunião. Isto implica a derrogação da Lei Mordaça, assim como de toas as formas de repressão burocrática para factos que não constituem claros comportamentos sancionáveis.

#A garantia plena do direito à greve o que supõe a derrogação do artigo 315.3 do Código Penal, reconhecido como “delito de coacção à greve”, que tem sido utilizado contra a mobilização dos trabalhadores.

# A independência efectiva da justiça dos interesses políticos e económicos, e a plena garantia do direito à Justiça. Dentro deste capítulo, cabe considerar a reforma ou liquidação da Audiência Nacional, que actua para todos os efeitos como um tribunal de excepção.”

Notícia no jornal digital Diagonal, texto original do abaixo-assinado em castelhano e lista de primeiros assinantes aqui : https://www.diagonalperiodico.net/movimientos/29350-chomsky-negri-ali-manifiesto-derechos-y-libertades-civiles.html

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